ÚLTIMAS »

Jumenta Parida renasce com as novas gerações de bandas


Antonio Filho faz uma viagem sentimental e relembra Feira do Jiriquiti e Jumenta Parida

Por Antonio Filho

Eis que na madrugada, procurando a esmo assunto para escrever no Mafuá do Malungo, encontro, pelos frenéticos frames do mundo binário, a bíblica figura de Robério Augusto. Conheço o camarada há mais de uma década, contada frouxamente em generosos 5 ou 6 biênios. Robério Augusto, a quem convidei a conceder uma entrevista ao Mafuá e a participar de nossa redação, é capítulo essencial da história da música pop alternativa, pelo menos, dos últimos 20 anos. Agora, simples companheiros de copo e parceiros de bar & restaurante masmetragaumacervejageladinhadetrincarosdentesaíporfavor, chegamos a trabalhar juntos no início dos anos 2000 nas produções do Espaço Cultural do atual IFCE (antigo IFET, CEFET, Escola Técnica Federal do Ceará) com, sua namorada na época e minha eterna melhor amiga, Thaís Monteiro.

Inesquecível, uma dessas produções, além do Projeto Sextarde e das exposições na galeria do Espaço Cultural, foi sem dúvida a Feira do Jiriquiti. A Feirinha, como era carinhosamente chamada, consistia num espaço de completa (quase que era pra cair na gandaia) liberdade de expressão artística. Ocorria sempre aos terceiros sábados do mês do ano de 2001 no estacionamento da maior instituição de ensino técnico do estado do Ceará. Logo no meio da tarde por volta de umas duas e meia o palco e o som eram montados e enquanto as bandas passavam o som os feirantes, artesãos, camelôs, carrinhos de comida e bebidas não-alcoólicas iam tomando seu lugares sob as arvores e palmeiras imperiais tornavam aquele espaço, naquele exato momento da tarde, um pouco mais habitável, aliás o sol do Ceará não tem pena de ninguém.

A Feira do Jiriquiti

Por volta de uma cinco da tarde os primeiros visitantes começavam a chegar. Entre uma barraquinha e outra, adquiriam LP e livros, experimentavam as roupas personalizadas da Silvia Moura e Nivardo (artista plástico que um dia me presenteou com uma de suas camisas após a leitura de um poema meu, até hoje me emociona aquele gesto de generosidade). Examinavam os artesanatos que eram muitos, lembro bem da simpática mãe da Joyce Custódio e suas bijuterias e bibelôs que tantas vezes me matou a fome nas visitas estratégicas que lhe fazia de surpresa em pleno meio dia. Eram tantos os expositores, acredito que deve ainda haver uma lista os nomes deles perdida em algum arquivo por aí. Só não resgato agora para não perder o ritmo da memória.

Enfim, a noite chegava e o palco começava a sua sina de apresentações. Um poeta se apresentava para os poucos amigos que levavam, o poeta seguinte, no entanto, já tinha um pouco mais de público, além dos seus gatos pingados, aproveitava o público do poeta anterior. Em seguida, vinha a primeira atração musical, geralmente voz e violão, um banquinho e o fim de tarde trazendo levemente a noite ao som da voz gente que até hoje está por aí nas esquinas da arte: Luciano Albuquerque, Joyce Custódio, Leo Mackelene, Fernando Rosa, Gleucimar Rocha da banda Eletrocactus, Argonautas.

Depois, nova dupla de poetas, mas dessa vez com mais público, embora não mais atento. A feira fervia nas últimas edições, o Capitão América, um de nossos seguranças disfarçados, ao lado do Incrível Hulk e do Homem Aranha ou do Justiceiro (também nunca entendi essa preferência pelos Vingadores) acompanhava até a saída algum descuidado que denunciou o próprio baseado. Aí, vinha os dois próximos e últimos blocos musicais intercalados por mais uma dupla de poetas. Era o momento que os demônios abriam as asas e afiavam as garras e tripudiavam no inferno.

Robério Augusto, o Sacramento, nessa hora, tomava o meu lugar ao microfone e anunciava as bandas. Tantas! Dago Red (banda do próprio Robério, a mais antiga ainda em atividade no Ceará), Obscure, Projeto Cactus (que depois viria a ser chamada Eletrocactus), Macunaíma, Alegoria da Caverna, Cinco em Ponto (grupo coral), Alkalina, Dress, Belasco. Tantas! Impossível lembrar de todas sem a ajuda da memória dos que por lá passaram. Mas uma banda, a que motivou essa crônica sentimental, precisava ser especialmente citada, Jumenta Parida.

A banda Jumenta Parida

A banda Jumenta Parida foi certamente um fenômeno. Para onde ia arrastava o próprio público, fãs realmente sinceros. A Concha Acústica da UFC, por exemplo, durante as calouradas, ia abaixo. Uma vez, flagrei camelôs vendendo a versão pirata do disco da banda no centro de Fortaleza. Na época, cheguei a comprar um destes CD's para mostrar. A Jumenta Parida arrebentou no terceiro Ceará Music, sem dúvida, até hoje, foi a banda de pop rock alternativo que mais fez sucesso na história do evento. Ridículo e inacreditável, que, mesmo a despeito de tudo isso, a banda tenha sofrido tantas críticas. Os argumentos mais vazios eram usados, letras ruins – argumento subjetivo e malicioso; melodias fracas – novamente a subjetividade e a malícia é base do argumento; “chupação” dos Raimundos – esse argumento, sim, vale um comentário mais extenso.

Ora, “chupação” dos Raimundos, por quê? Se a banda Raimundos tinha a proposta de fazer um hardcore de matiz musical nordestino, por que que a banda Jumenta Parida não poderia fazer o mesmo? A resposta é simples. É claro que sim! A banda Jumenta Parida ao optar pela mesma estética musical da banda Raimundos não desmerece nem anula sua autenticidade. Em primeiro lugar, porque o gênero musical hardcore regional é dificílimo de se fazer já que por ser tão linear e rítmicamente marcado, conseguir compor músicas com melodias, harmonias e arranjos diferentes só faz quem tem técnica musical e criatividade suficiente pra conseguir conquistar um público cativo como a banda acabou fazendo e muito bem. Em segundo lugar, a banda Raimundos, optou por composições existenciais de temática adolescente e quase sempre amorosa. Opção totalmente oposta adotada pela banda Jumenta Parida. A banda, além da sonoridade de matiz nordestino, sertanejo, litorâneo e/ou urbano (pois até se inspirou no maracatu cearense em suas canções) que ela adotou, estendeu essa proposta para além da música e foi para o texto de suas letras, que sempre tinham uma preocupação social e de temática essencialmente regional, nordestina e cearense.




A banda Jumenta Parida foi e continua sendo um fenômeno, pois até hoje, mais de um lustro depois de sua dissolução e mais de uma década de sua criação continua influenciando as novas gerações de bandas de rock cearenses. O caso mais recente que pude perceber é a banda Mara Hope que tem até clipe postado no portal You Tube da música Sou do Nordeste. Na verdade, diria que a banda Jumenta Parida (ao lado das não menos importante e pioneiras Dr. Raiz, Soul Zé, Dona Zefinha e Idson Ricart) tem a importância fundamental de ter sido uma das primeiras bandas cearenses que provaram ser possível, pós-Pessoal do Ceará e Massafeira, fazer música popular autoral de qualidade e ainda ser capaz de cativar um público fiel e exigente.

E sinto, sem medo de ser arrogante, pois acredito que os contemporâneos, amig@s e colaboradores daqueles tempos certamente confirmariam minhas palavras, que a Feira do Jiriquiti (também ao lado do Espaço Cultural do Cefet; dos DCE's da UFC, UECE e suas calouradas; das Rodas de Poesia do Centro Dragão do Mar, curadas pelo grande agitador cultural Carlos Emílio Correia Lima; do Espaço Cultural de Domínio Público, o antigo e saudoso Domínio Público; e do antigo Teatro Bar Chico Anísio) também, embora em parcela bem humilde e menor, ajudou a construir essa história de dedicação à cultura e à arte em Fortaleza e no Ceará.

Abaixo, confiram o clipe da banda Mara Hope interpretando Sou do Nordeste da banda Jumenta Parida:

Cadastre seu e-mail aqui para receber nossas notícias automaticamente ou clique aqui para assinar nosso feed.

1 comentários para Jumenta Parida renasce com as novas gerações de bandas

  1. Carlinha,

    Você mora num cantinho muito bonito no coração eletrônico do Mafuá do Malungo. E é verdade, você foi uma d@s dezenas de poet@s que passaram pelos palcos da Feira do Jiriquiti. E, por sua única e exclisiva culpa, comprometo-me ainda a escrever somente sobre a poesia daquela época.

    Um grande abraço e volte sempre ao Mafuá do Malungo, essa eterna casinha de amigos.

Deixe um comentário


Informações da cidade
Institucional
Informações úteis

+ POPULARES

2010 Solonópole. - Desenvolvido por milvinil